domingo, 20 de dezembro de 2009

- Bauru

1. Bauru - significação
Imagem representativa - índios Beuruz - habitantes primitivos da região
http://www.historiadigital.org/curiosidades/25-curiosidades-sobre-os-indios-brasileiros/
A primeira referência histórica ao nome Bauru, 'Terra dos Baurus', adiante de Botucatu e da Serra dos Agudos, ocorreu no ano de 1750, quando o bandeirante Manuel Lopes pretendeu por lá, lavouras e cercados de gados para abastecer monçoeiros que faziam uso do Tietê (Bauru, 1987: 7-8). 
Os silvícolas, cognominados 'Beuruz', não admitiram a fixação de Lopes e sua gente entre os vales dos rios posteriormente designados Bauru e Batalha, onde abundavam a 'ubá', tipo de planta herbácea utilizada para se fazer cestos, jacás e balaios, e entre as 'ubá' pululavam os pássaros 'uru', galináceos da família dos faisões, daí o termo 'ubá-uru'.
Tanto os 'Beuruz' quanto 'uba-uru' seriam sugestivos significados para Bauru, todavia, para os autores, firmados em Salvador de Mendonça*, apontam Bauru vinda de 'Baru-y ou Baru-hu', das contrações 'baru' - árvore e 'y' - rio, então, 'rio da árvore - árvore do rio', ou 'baru' - árvore e 'hu' - água, qual seja, 'água da árvore - árvore da água' (O Ypiranga, 'Significação dos nomes indígenas da Provincia de S. Paulo vertidos da língua tupy para a portugueza'publicação seriada, edição nº 58, de 09/10/1867: 2).
Salvador [de Menezes Drumond Furtado] de Mendonça considerava Bauru designativo de uma cachoeira regional no Rio Tietê, sendo o significado de Bauru [Água da árvore Baru], dado por ele, embasado nas obras do jesuíta Luiz Figueira: 'Dicionário e Gramática da Língua Geral dos Indígenas' (1621); no 'Dicionário da Língua Tupi', do estudioso e conhecido poeta, Antonio Gonçalves Dias, publicado na Alemanha, entre 1854/1859, pelo editor Brockhaus; e na obra do médico e doutor em Botânica, Carl Friedrich Philipp von Martius (1794/1868), dedicada ao Brasil: 'Glossalia Linguarum Brasilensium [Línguas brasileiras], 1867', reunindo os termos indígenas colhidos pelo naturalista alemão Johann Baptist von Spix, ambos numa missão pelo Brasil entre 1817/1821.
—O tempo das conclusões de Mendonça, para os nomes indígenas de povoações na província paulista, era muito próximo ao advento sertanejo de 1850/1851. 

2. Dois nomes de Itapetininga nas 'Terras dos Bauru'
A conquista do alto da Serra Botucatu por Joaquim da Costa Abreu e suas gentes, nos anos de 1830, permitiu e até incentivou os brancos avançarem sobre as 'Terras dos Baurus'. Em 1834, o morador em Itapetininga, Pedro Nardes Ribeiro delimitou área de propriedade nas cercanias de Aimorés, atual região de Bauru (Bauru, 1977: 7), e por lá se estabeleceu com sua família, agregados e escravos, até que ações indígenas o obrigaram retirar-se.
Anos mais tarde, certo Manoel Rodrigues de Almeida, promoveu o registro paroquial de terras do lugar 'Campos Novos' [Bauru], informando título de posse adquirido de Pedro Nardes Ribeiro em 1834 (AESP: RPT/BTCT nº 344: 119-v).

Igualmente o capitão José Gomes Pinheiro Machado, político itapetiningano e dono de fazendas no alto da Serra Botucatu, registrou propriedade em Bauru, confinante ao Nardes; no entanto, sentindo as agruras do vizinho, optou apenas registrar sua posse (AESP, RPT/BTCT nº 01: 197-v, pelo Aviso-Circular, Imperial, de nº 22/10/1858).

No Recenseamento de 1835, para o Município de Itapetininga, foram contados o capitão Gomes Pinheiro e família, lá alocado pela Guarda Nacional, e, também, o Pedro Nardes, este, com sua mulher e filhos, residente no 14º Quarteirão do Bairro de Tatuí, ele com idade de 44 anos, citado negociante e agricultor em terra própria, no segmento algodoeiro (De Franceschi, 05/10/2009, Dados Censitários para Itapetininga, 1835, transcritos e cedidos aos autores, CD: A/A, 2009).

Não se sabe exatamente quando, talvez em 1836, a família e os agregados de Pedro Nardes teriam sido atacados por índios salvando-se com os seus, para depois rumar para o Rio Grande do Sul, com estadia em Castro [PR], contados o filho Damaso, uma filha e outra morta no atual estado do Paraná, vítima de ataque indígena. Chegou ao sul em 1860 (De Franceschi, op.cit. CD: A/A 2009).

Nantes admite a saída do Nardes da região de Bauru, rumo a Castro - PR onde permaneceu algum tempo, deixando descendentes (CD: A/A, 2007/2009), mas, coube à pesquisadora 'De Franceschi', efetivamente comprovar detalhes quanto a presença do patriarca Nardes em Rio Grande do Sul.

—Janice De Franceschi, pesquisou para a obra "Ribeiro Nardes - Uma família do Brasil" - do autor João Augusto Ribeiro Nardes, Ministro do Tribunal de Contas da União.


3. A passagem de uma das colunas de José Theodoro de Souza na região

Duas décadas depois, em 1850/1851, com a passagem de uma das frentes do bando de Theodoro de Souza pelas ditas 'Terras dos Baurus', a história fez-se oficial para povoamento branco, com as presenças pioneiras de Sebastião Pereira, Pedro Francisco Pinto, também chamado Pedro Francisco Franco, e os irmãos Antonio e Francisco Rodrigues de Campos, apossadores de terras onde feitas as fazendas Flores e Grande, ponto de partida para a ocupação territorial:

—"Dentre aqueles que primeiro se aventuraram a percorrer os sertões bravios, (...) os historiadores são unânimes em apontar dois nomes, que ficaram na memória de muitos, como os posseiros do movimento do desbravamento e colonização daquelas regiões inóspitas, domínio dos íncolas e de feras selvagens. Trata-se, respectivamente, de Pedro Francisco Pinto e Sebastião Pereira. (...). Essas incursões partiram de Botucatu" (Bauru, 1987: 7). 

No entanto, os índios retornaram logo e, já em 1852, Pedro Francisco Pinto ou Franco foi trucidado às margens do rio Batalha, conforme relatório oficial de 1858 (Donato, 1985: 107, referência mencionada: 'Ao número 894 da revista IFGSP (...) artigo no qual relata ataques indígenas entre Botucatu/Bauru e vítimas: Pedro Francisco Franco, trucidado'). Os brancos sobreviventes teriam deixado o lugar, alienando suas propriedades, ou partes delas, a outros interessados.

Francisco Rodrigues de Campos é mencionado vendedor - posseiro primitivo e divisante de terras em diversos registros paroquiais para a região de Bauru, então Bairro da Batalha (AESP, RPT/BTCT, Livro 123), a tratar-se de articulador de posses, assim como seu irmão Antonio. 

São mencionados outros nomes na região: 

—'Florindo Resende da Conceição, Francisco Euzebio da Costa, Francisco Luis, Jeremias Paula Cabral - do sogro Victorianno da Motta de Oliveira, Jeronimo Franco, João Bapthista [Baptista] Marques de Almeida, João Prodente [Prudente], José Francisco Ferreira, José Joaquim Barboza de Carvalho, José Valentim, Matias Teicheira [Teixeira], Marcellino Baptista Ribeiro, Salvador Monteiro, Vicente Ferreira de Aquino e Violante de Tal.'

Felicissimo [Felicyssimo] Antonio de Souza Pereira registrou na paróquia da vila de Botucatu, porções diversas de terras na região de Bauru, todas por compras, e noutras citado divisante (AESP, RPT/BTCT, Livro 123), a pressupor posses articuladas em nome de terceiros, sendo ele o 'verdadeiro dono', atitude típica de financiador do empreendimento bandeirante.

Antonio Teixeira do Espírito Santo, foi outro grande nome na formação bauruense, figurando em diversos registros paroquiais de terras, como comprador e divisante (AESP, RPT/BTCT, Livro 123), também presente onde a denominada sentinela avançada do sertão, Espírito Santo da Fortaleza, com forte indicativo de posses articuladas e financista da empreitada sertaneja.   


4. As adversidades do Felicíssimo

Durou quase nada a ousadia do Felicíssimo, apenas até 1856, quando índios bravios atacaram e chacinaram alguns dos membros de sua expedição e feriram outros.

Por antigas tradições e alguns autores regionais, o Felicissimo e sua família teriam escapado dos ataques indígenas; todavia, mais correto, que o fazendeiro ainda não residia no lugar e sim em Botucatu, esperando sertão amanhado.

Mas o Felicíssimo continuaria partícipe da história de Bauru, diretamente ou por seus bugreiros.

Detalhes dos acontecimentos ligados a ele estão colocados numa representação ao então presidente da Província de São Paulo, Francisco Diogo Pereira de Vasconcellos (29/04/1856 - 22/01/1857):

—"Ilmo. Exmo. Senhor. Presidente da Província:

Perante V Excia. comparece Felicíssimo Antônio Pereira, morador no lugar denominado o Bauru, termo da Vila de Botucatu, para o fim de reclamar do Governo da Província providência contra as depredações e assassinatos perpetrados pelos indígenas das imediações daquele lugar: Ainda em 20 de agosto do corrente ano foi assaltada a fazenda do Sup. pelos ditos índios, e fizeram uma horrível carnificina nos trabalhadores (...). A criação de uma Aldeia no dito lugar, a nomeação de um missionário digno deste nome e todas as outras medidas de catequese, se tornam indispensáveis, para que os povos levados ao desespero, não lancem mão dos bárbaros recursos que tanto assustavam os passados séculos. O Sup., Exmo. Sr., vem perante V.Excia. reclamar providências e tranqüilo espera ser atendido.

a) Felicíssimo Antonio Pereira."

-(Apud Bauru - Edição Histórica, transcrição de fac-símile, em grafia atualizada, 1987: 8-9).

—No documento original consta o despacho dado pelo Presidente da Provínica: "Informe o Sr. Brigadeiro Director Geral dos Indios. Palacio do Governo de São Paulo, 14 de ouctubro de 1856 - Vasconcellos" (AESP, Documentos antigos para Botucatu e região).

A denúncia do Felicissimo durante dois anos não foi levada a sério pelas autoridades e, "Só em 1858, ante as notícias dos duros ataques dos silvícolas, o Felicíssimo foi chamado a São Paulo para a apresentação de seu “plano de guerra e de catequese" (Donato, 1985: 108).

 

4.1. O retorno do Felicissimo

Autorizado pacificar os índios, afugentá-los ou mesmo aprisioná-los e metê-los em aldeamentos, entre as recomendações, o Felicissimo retornou à região de Bauru, no ano seguinte, 1859, "à frente de 135 homens divididos em três grupos, todos bem armados" (Donato, 1985: 108), para praticar terrível massacre contra indígenas, visto por ato de vingança pela derrota que lhe foi imposta em 1856.

Felicissimo cumpriu as ameaças contra os indígenas, através das dadas, para tornar a região de Bauru conhecida em todo Império, como local de massacre aos índios, cujos acontecimentos subsidiaram notícias aos jornais de oposição ao governo, além da ocorrência se tornar causa maior para os embates políticos entre conservadores e liberais, com isso a exigir urgentes medidas das autoridades.

Com repercussão indesejada o Felicíssimo viu-se obrigado a dar satisfações à Justiça.

A história local ameniza as ações de Felicíssimo como matador de índios, ao colocá-lo naquelas bandas de Bauru, no ano de 1859, juntamente com Antônio Teixeira do Espírito Santo, quando este se arranchara um pouco adiante de atual Agudos, nas posses adquiridas de um dos irmãos Rodrigues de Campos, onde fundou uma sentinela avançada, a 'Capela do Divino Espírito Santo da Fortaleza', para garantir a segurança daqueles que desejassem chegar e trabalhar a terra. 

Assim diz o legado: "Ao se estabelecerem nesta região, iniciaram um difícil trabalho, isto é, a derrubada das matas seculares, onde ergueram paliçadas rústicas e levantaram casebres para que pudessem alojar suas famílias" (Bauru - Primeiros tempos da nossa Bauru). 

Os índios estavam ou retornaram mais ameaçadores, motivando outros relatórios dos iminentes perigos que novamente apresentavam requintes de crueldades e que atravancam de vez o progresso, pelo temor.

 

5. A 'convocação' de José Theodoro de Souza

Os fazendeiros não mais suportavam as dilações de governo, quando resolveram pelo chamamento de José Theodoro de Souza, para pacificar a região:

—"(...) pouco depois, o Juiz Municipal de Botucatu denuncia uma chacina na ‘região do rio Batalha’, perpetrada, entre outros, por José Theodoro de Souza, 'velho sertanista, notável pela sua vida tragueira e ainda mais notável pelo temor que seu nome inspira nos selvagens, pelas barbaridades por ele praticadas nos encontros com os índios tem tido'-" (Apud, Tidei Lima, 1978: 83).

Com a presença de Theodoro, os primitivos posseiros retornaram, além de outros chegadores, a exemplos de Vicente Martins, Luiz Francisco Gomes e aparentados, entre os bugreiros:

—"Acrescentou ainda o magistrado que 'esta imensa área na sua quase totalidade tem sido apropriada e vendida por José Theodoro de Souza e pelos irmãos Francisco e Antonio de Campos. É pois manifesto que essas pretendidas posses são a causa da destruição do índio que em direito é melhor possuidor dos terrenos'-" (Apud, Tidei Lima, op.cit).

O alarma do magistrado deu em nada. Theodoro não era o Felicíssimo, e, apenas a bastar uma viagem dele à capital da Província de São Paulo, acompanhado de uns tantos índios que o chamavam de 'Pae', para se ganhar o apoio político necessário de toda província e império para sua política indigenista. 

A viagem de Theodoro consta em documentos oficiais do governo paulista, além dos testemunhos e referências postas por João Mendes e Joaquim Antonio Pinto Junior (Giovannetti, 1943: 129). 

Quanto aos irmãos Francisco e Antonio de Campos, são os mesmos Rodrigues de Campos, pioneiros bauruenses apoderadores de terras na região do rio Batalha. A história pouco ou nenhuma lembrança faz a esses irmãos no pioneirismo bauruense, contudo, ao relatar que o posseiro Sebastião Pereira repassou partes de suas terras a favor de Mariano José da Costa e João Baptista Monteiro, em meado de 1850, menciona um deles, apenas pelo sobrenome Rodrigues de Campos, como dono de terra com registro anterior para a Fazenda [Córrego] das Flores, que Monteiro adquirira de Sebastião Pereira (Bauru - Edição Histórica, 1987: 7-8). 

As grandes propriedades bauruenses foram, então, quase todas divididas em fazendas menores e postas a vendas, e outras partilhadas entre herdeiros e meeiros, para chegada das primeiras famílias para o efetivo trabalho nas terras e o lugar tornar-se mais seguro, com os proprietários residentes próximos, a permitir características de bairro rural, assim denominado:

—"O Bairro do Bauru que era em verdade, no dizer de José Fernandes, um vasto complexo de sítios povoados que se disseminavam ao longo do curso do Ribeirão Bauru e de seus pequenos afluentes, e se estendia muitas léguas em redor, pela Água Parada, Anhumas, São Sebastião da Alegria, Rosa da Batalha, Soturna e Quilombo" (Bauru - Edição Histórica, 1987: 14). 

 

34.13.6. Espírito Santo da Fortaleza

Ao abrigo desta sentinela ergueu-se o povoado logo conhecido por Fortaleza do Espírito Santo, depois Espírito Santo de Fortaleza, em 1859, e finalmente Piatã, segundo Giesbrecht:

—"(...) quando a Paulista [Cia. Paulista de Estradas de Ferro] chegou lá com sua linha, em 1903, encontrou a vila decadente, mas plantou sua estação, já com o nome de Piatã, por sugestão de Adolfo Augusto Pinto, engenheiro muito influente nas decisões da Cia. Paulista, e nome que somente foi dado ao distrito em 1910" (Giesbrecht, 2001: Piatã, atualização em 2010).

—A história documental, no entanto, informa Piatã como distrito pertencente a Espírito Santo de Fortaleza, e não ambos uma só localidade com nomes diferentes (Nota dos Autores). 

Em 1868, enquanto Bauru era apenas bairro rural ou sede para fazendas regionais, a localidade de Fortaleza ganhava notoriedade:

—"Capella do Divino Espirito Santo da Fortaleza - Districto da parochia de Lençóes - Por meio de uma escriptura publica, lavrada nas notas do tabellião de Lençóis, Antonio Francisco de Oliveira Bittencourt, aos 18 de junho de 1868, o alferes Manoel José Ferreira e sua mulher Anna Rosa do Carmo fizeram doação á referida capella, para edificação de uma casa parochial e para o patrimonio da mesma, de um terreno de duzentas braças quadradas, mais ou menos, tendo como balisa a egreja, sendo suas divisas as seguintes: 'Principiando na barra do ribeirão Fortaleza, sóbe pelo braço da esquerda acima até onde dér meio quarto de légua, daqui procurar um pao de açoita-cavallo, isto é, em linha recta, fazendo quadra, e pela agua abaixo, onde tiveram principio estas divisas'-" (Correio Paulistano, edição de 29/05/1941: 5, Capellas do Estado de S. Paulo, por Cavalheiro Freire - Padre Paulo Aurisol - do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo).

—Felicíssimo faleceu em 1869.

Somente em 1880 Espírito Santo da Fortaleza viu-se reconhecido freguesia, pela Igreja, e, depois, político-administrativa, ainda em 1880, pela Lei nº 61, sob a mesma denominação de Espírito Santo da Fortaleza, no município de Lençóis. Sete anos passados e a localidade elevada à categoria de vila, por Lei Provincial de 02 de abril de 1887, portanto, município da comarca de Lençóis, instalado aos 7 de janeiro de 1889, com a eleição de sua primeira Câmara Municipal.

O município era constituído dos distritos, Espírito Santo de Fortaleza e o de Piatan também grafado Piatã (IBGE, Biblioteca, Bauru-SP), com Espírito Santo por sede, além do bairro rural de Bauru, já com características urbanas, o qual, vencendo resistências de Lençóis e de Fortaleza, em 30 de agosto de 1893, pela Lei nº 209, foi classificado como distrito de paz anexo a Espírito Santo de Fortaleza, instalado em 6 de julho de 1894, daí 'boca do sertão' regional.

Os primeiros problemas de Fortaleza tiveram início, em 1884, quando o fundador Antonio Teixeira do Espírito Santo transferiu residência para o bairro rural Bauru, na 'Fazenda das Flores', parte restante adquirida de João Batista Monteiro.

 

34.13.7. E Bauru suplantou Espírito Santo da Fortaleza

Muitos fortalezenses, seguindo o pioneiro, venderam suas propriedades para adquirir outras, mais nas proximidades de Bauru onde levantaram suas casas, favorecidos pela iniciativa de Antonio Teixeira que doara, em 15 de novembro de 1884, uma área de terras ao Divino Espírito Santo e a São Sebastião de Bauru, de 57 hectares e 25 ares, para formação do patrimônio, com documento escriturado em 21 de março de 1885 e assim descrito:

—"Digo eu abaixo assinado Antonio Teixeira do Espírito Santo que dentre os meus bens que sou senhor e legítimo possuidor com livre e geral administração e assim uma fazenda no lugar denominado nas vertentes do Ribeirão de Bauru neste distrito da freguesia Espírito Santo da Fortaleza e termo da Vila de Lençóis, cuja fazenda já foi inventariada por falecimento de minha mulher Marcilina Marta de Jesus e a mim tocou a meação ou duzentos mil réis, do legítimo de minha parte faço doação ao Santo Sebastião e Divino Espírito Santo da quantia de cem mil réis, bem entendido, que será esta doação no capão ligado com as terras tantas mesmas pela água abaixo: Digo pelo veio da água abaixo até a barra: e subindo pelo veio da água abaixo até a barra: e subindo pelo veio de Bauru acima, até fronteirar com as mesmas divisas feitas nas escrituras velhas que eu fiz doação e por ser esta doação de minha plena vontade, e sem constrangimento de pessoa alguma, transfiro-lhes toda a posse, (...), eu tinha ficado assim o curador da Igreja na obrigação de pagar a competente SIZA. E por ser esta doação de minha livre vontade, peço a justiça do Império que dê a esta escritura todo inteiro vigor, como se fosse em pública forma e por eu não saber ler e nem escrever pedi a quem assinasse comigo. Sitio do Barreiro, 21 de março de 1885. A rogo do doante Antonio Teixeira do Espírito Santo.

José Jacinto de Morais

Tenente Veríssimo Antonio Pereira

Joaquim Antônio Prudente".

-(Bauru, Edição Histórica, 1987: 13-14).

—Em 1886 faleceu Antonio Teixeira do Espírito Santo.

Depois, em 3 de maio de 1893, Veríssimo Antonio Pereira, descendente do Felicíssimo, doou para o mesmo patrimônio uma área:

—"[que] tem início no Ribeirão Bauru, junto à divisa da primeira doação, subindo por este até a foz do Córrego Água do Sobrado, de onde parte uma linha reta em W-E até encontrar-se com o Córrego das Flores e descendo por este até a divisa com a primeira divisão. Esta área é de 134 hectares e 80 ares" (Nava, História Viva).

—Teixeira e Felicíssimo passaram para a história como os fundadores de Bauru.

Bauru somente viu-se progressista a partir de 1888, com a chegada do mineiro Azarias Ferreira Leite, "juntamente com a esposa e o sogro, ambos fluminenses" (IBGE / EMB, Volume XXVIII, Bauru, 1965: 132-133), para organizar uma grande fazenda de café e atrair outros pioneiros para o local, em sua maioria amigos e parentes de Azarias Ferreira Leite além do parente e sogro João Batista de Araújo Leite.

Na época, as mais recentes sentinelas regionais do sertão quase sempre tendiam para maior crescimento populacional e desenvolvimento, que aquelas que lhe deram procedência, porque delas partiam as marchas para interiorizações, e a elas recorriam os desbravadores para os seus acertos. Sob tais aspectos o vilarejo de Bauru, já suplantava Fortaleza, a sede do município, então reduzida apenas a centro político-social.

Vencendo resistências de Lençóis e de Fortaleza, em 30 de agosto de 1893, pela Lei nº 209, foi classificado como Distrito de Paz anexo a Espírito Santo de Fortaleza, instalado em 6 de julho de 1894

Bauru, como Distrito de Paz anexo a Espírito Santo de Fortaleza (Lei 209/1893), instalado aos 06 de julho de 1894, pode participar da eleição de 30 de julho 1895, triênio 1896/1898, para a Câmara Municipal [de Fortaleza], concorrendo candidatos dos dois distritos, e tudo parecia indicar que a sede teria quatro das seis cadeiras do legislativo, com isso a eleger, ainda, o Intendente.

Como o esperado, não foi uma eleição tranquila, tanto que ainda hoje os historiadores divergem quanto ao resultado, relação dos eleitos, e das artimanhas e consequências de tal pleito.

Fonte tida oficial informa:

—"[que] no auge das discussões entre os políticos de Bauru e os de Fortaleza, uma honrosa composição foi proposta, com os lideres de nossa cidade [Bauru] fingindo aceitar, possibilidades, [para que] o sangue não viesse manchar aquele acontecimento. No Cartório de João Pedro de Oliveira funcionou a seção eleitoral do Distrito e o juiz de Paz, Araújo Leite foi quem a presidiu, sob os olhares rigorosos de uma fiscalização atenta de ambos os lados. E assim chegou-se o final do pleito (30 de julho de 1895), felizmente com a ausência de um conflito que estava previsto, mas não consumado. Procedida a votação seis bauruenses conseguem se eleger: Manoel Jacynto Bastos, Domiciano Silva, João Antônio Gonçalves, José Alves de Lima, Joaquim Pedro da Silva e Francisco Pereira da Costa Ribeiro" (Bauru - História:  Primeiros Tempos).

Noutra citação, que figura em referências oficiais, escreveu-se:

—"Pretendia, porém, Fortaleza, que quatro dos vereadores pertencessem a sua sede municipal. Mas o resultado (...) favoreceu quatro moradores no Bauru (João Antônio Gonçalves, José Alves de Lima, Manuel Jacinto Bastos, e Domiciano Silva), sendo que por Fortaleza elegeram-se apenas Joaquim Crispim Alves Ferreira e José Teodoro Pereira" (Bauru, Edição Histórica, 1987: 15).

Nava Sobreira diz, numa terceira versão:

—"Ao se realizar a apuração dos votos o presidente da Câmara de Fortaleza. José Theodoro Petente, denunciou haver irregularidade na eleição, pois o Distrito do Bauru elegera todos os seus candidatos a vereadores. Visto que anteriormente havia sido feito em Bauru, um novo cadastramento eleitoral aumentando os eleitores de Bauru, enquanto que em Fortaleza não havia sido feito o mesmo" (Nossa Bauru, O que se comemora em 1º de agosto?).

—Fortaleza contou apenas 24 eleitores cadastrados, enquanto Bauru apresentou 66 votantes.

Fortaleza, por inconformismo, conquistou deferimento do Senado Estadual para nova eleição aos 07 de novembro de 1896, repetindo Bauru o mesmo desempenho dos seis a zero - pela primeira fonte, ou tudo em vão para Fortaleza, de acordo com a segunda origem, sem informar números ou nomes dos eleitos, certamente os mesmos.

Para Nava Sobreira o resultado foi jurídico e não político, ao cientificar que os vereadores, José Theodoro Petente e Cornélio Brantes Freire da Rocha recorreram ao Tribunal de Justiça do Estado e a apuração ficou suspensa três meses, até o julgamento, com sentença desfavorável aos fortalezenses. Cientes, os vereadores impetrantes não comunicaram o despacho, para com isso retardar ou evitar a posse aos bauruenses eleitos, fato este descoberto por Domiciano Silva.

Apesar da confirmação dos resultados das urnas, à prepotência dos representantes de Fortaleza reagiram os eleitos por Bauru, num estratagema político que retirou de Fortaleza a sede municipal a favor de Bauru, com sérios desentendimentos sobre competências da Câmara em tais assuntos, conflitos e atos isolados de violências entre populares.

Tal transferência de sede ocorreu com anuência do chefe político de Bauru, Araújo Leite, a custos convencido por seu genro e sucessor Azarias Leite. O vereador fortalezense Domiciano Silva - então vice-presidente da Câmara Municipal em encerramento de mandato, já algum tempo estabelecido no Distrito de Bauru e por este reeleito, fez a seguinte narrativa dos fatos:

—"Às onze e meia, os vereadores de Bauru, cujo relógio marcava doze horas, entraram no recinto da Câmara. Declarando a ausência do Presidente da Legislatura anterior, José Teodoro Petente, a quem cumpria de acordo com a Lei, instalar a sessão, eu, na qualidade de Vice-Presidente, o declarei feito e convidei o vereador eleito mais idoso, que era Manuel Jacinto Bastos, a assumir a Presidência. Joaquim Alves Ferreira, Intendente e Vereador eleito, que se achava no recinto, estranhou a abertura dos trabalhos, puxando o seu relógio, que marcava onze e trinta, mais ou menos; e apresentou protesto que não se estava na hora legal e nem se achava presente o Presidente. Insistimos, procurando convencê-lo de que o relógio estava errado, mas não se convenceu e deixou o recinto, com a declaração de que não tomaria parte nos trabalhos. Tomamos então a iniciativa de fazer o reconhecimento dos poderes, passando logo depois a eleger os membros da mesa. Foi eleito para Presidente Joaquim Pedro da Silva: eu para Vice-Presidente e José Alves de Lima para Intendente. A seguir, o Capitão João Antonio Gonçalves, nosso companheiro, tirou do bolso a indicação histórica, que eu redigira aqui em Bauru, e que ele fora incumbido de apresentar, propondo a mudança da sede do Município."

E esta foi a histórica indicação do edil capitão João Antonio Gonçalves:

—"CONSIDERANDO que os vereadores que compõem a Câmara Municipal do Espírito Santo da Fortaleza são todos residentes na próspera e frutuosa povoação de Bauru:

Que aquela povoação dista mais de quatro léguas da decadente 'Vila de Fortaleza';  Que por causa da distância os vereadores não poderão reunir-se tão freqüentemente quanto exigem os interesses municipais que lhes foram confiados pelo eleitorado;

Que, além desse inconveniente, sobressai ainda o da falta de recursos que há na despovoada Vila da Fortaleza, onde nem sequer existe quem possa fornecer aos vereadores, em épocas de sessão, as refeições diárias;

Que a Vila de Fortaleza está em completa decadência e total abandono, ao passo que a futurosa povoação de Bauru prospera, aumenta e povoa-se dia a dia; INDICO que seja elevada a Vila a povoação de Bauru pedindo para esse ato a aprovação do governo do Estado e desde este dia considere mudada para aquela Vila a sede da Municipalidade, dando-se disto conhecimento ao governo do Estado".

-(Bauru - Edição Histórica, 1987: 15).

Para Nava Sobreira (op.cit.), o horário da sessão de posse dos novos vereadores ocorreu da seguinte forma:

—"Prevenido de qualquer atitude de represália de Petente, no dia da posse da nova Câmara, em 7 de janeiro de 1896, Domiciano juntamente com os vereadores bauruenses, combinaram a seguinte estratégia: A sessão estava marcada para as 10h00, todavia quando eram 9h30 minutos os vereadores adiantaram os seus relógios em 30 minutos, chegando a Fortaleza as 10h00, horário alterado. Não estando presente o presidente da Câmara, José Theodoro Petente, o vice-presidente Domiciano Silva, assumiu a presidência e deu início a sessão."

—Casos semelhantes, em atrasar ou adiantar relógios, são contados em outras localidades, por exemplo, em Santa Cruz do Rio Pardo, parecendo algo próximo do anedotário político (Nota dos Autores). 

Apesar dos protestos políticos e apelações ao Tribunal de Justiça, a solução definitiva foi dada pelo Senado Estadual ao confirmar a transferência da sede do município pela Lei nº 428, sancionada pelo governo paulista em 1º de agosto de 1896: "O município de Espírito Santo de Fortaleza passa denominar-se Bauru, mudando-se a sua sede para esta ultima povoação", revogadas as disposições em contrário, para selar de vez o infausto político e administrativo de Espírito Santo de Fortaleza.

Diz a história que tudo transcorreu favorável às pretensões de Bauru, graças à intervenção política do deputado estadual Ezequiel Ramos.

Essa mudança da sede de município encerra uma fase da formação de Bauru, enquanto Espírito Santo de Fortaleza, já desde 1903, teve seu território anexado ao distrito de Piatã, nome pelo qual surge como distrito de Bauru, no ano de 1911, em divisão administrativa do Brasil, até ser formalmente extinto pela Lei Estadual 1590, de 17 de dezembro de 1917.

O progresso bauruense aconteceu de vez quando editado o Decreto 5349, de 18 de outubro de 1904, que estabeleceu o traçado em definitivo da Companhia de Estradas de Ferro Noroeste do Brasil, a partir da então vila de Bauru, por prolongamento da Estrada de Ferro Sorocabana que chegou ao local em julho de 1905.

O ápice progressista consequente do final do século XIX, enfim surgiria em 1910, com a chegada da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, firmando-se no denominado trinômio das paralelas de aço como 'Cidade Sem Limites'.