domingo, 20 de dezembro de 2009

Vias férreas - sinônimo do progresso

1. Estrada de Ferro Sorocabana
Inauguração ferroviária - Santa Cruz do Rio Pardo
Foto original de Américo França Paranhos
Acervo: Edwin Luiz Brondi de Carvalho
A Companhia Estrada de Ferro Sorocabana surgiu da dissidência da Companhia Ituana de Estradas de Ferro, quando um grupo de acionistas sorocabanos, sob liderança do engenheiro Luiz Matheus Maylasky, discordou da decisão de se construir linha férrea de Jundiaí a Itu, em detrimento a ligação Sorocaba - São Paulo. A fundação da Ituana foi no ano de 1870, enquanto a Sorocabana, dois anos depois.
Informa a história que a Sorocabana teve início aos 13 de junho de 1872, em Ipanema, depois Varnhagen, onde instalada a primeira indústria de siderurgia no Brasil [e América Latina], a Real Fábrica de Ferro de São João de Ipanema, no atual município de Iperó; a fundação da Siderurgia foi em 1811 por ordem direta do Príncipe Regente D. João VI. Em 10 de julho de 1875, cento e vinte quilômetros de trilhos ligavam Ipanema a São Paulo.
Nos anos de 1872/73 as Companhias controladoras das estradas férreas, as Ituana e Sorocabana, disputavam concessões do governo paulista, para explorar serviços e avançar trilhos para o interior, por caminhos diferentes. A Ituana pretendia o ramal Capivari - Tietê, enquanto a Sorocabana já conseguira licença para chegar a Boituva, com pretensões a Botucatu.
Sem perda de tempo, a Companhia Sorocabana apresentou ao governo paulista um audacioso projeto de integração fluvial e via férrea, desaprovado porque o relatório de Teodoro Sampaio não recomendava navegação dos rios Tibagi [paranaense], Paranapanema, Peixe, Aguapeí e Santo Anastácio.
Frustrada em primeira investida rumo ao sertão, a Sorocabana apresentou nova proposta, para o avanço ao oeste rumo a Botucatu, pelo vale do Tietê, e seguir adiante pelos povoados surgidos ao longo da estrada de terra que já avançava para além de Conceição de Monte Alegre. Com algumas modificações, sem alterar objetivos maiores, aos 25 de setembro de 1882 a Sorocabana teve deferido seu pedido para se chegar a Botucatu, abrindo mão de financiamento público e garantia dos juros públicos [participação estatal] que, costumeiramente, o governo oferecia aos empreendimentos pioneiros de grande monta.
Rapidamente a Sorocabana abriu eito e colocou trilhos numa sequência admirável, de 1883 em Cerquilho a 1889 em Botucatu, embora a lei que aprovava o avanço da Sorocabana, de Boituva a Botucatu, somente ocorreria aos 19 de março de 1887 - Lei [Imperial] de nº. 25, estabelecendo as estações ou paradas. 
O artigo 3º da mesma lei estabelecia permissão para a Sorocabana explorar, por setenta e cinco anos, o trecho Boituva - Botucatu, e seu prolongamento até "o rio Paranapanema, desenvolvendo-se a mesma pelo vale da margem direita do rio Pardo em direção da Vila de Santa Cruz", onde se pretendia trevo ferroviário, um pelo projeto conhecido por Linha Tibagi [Paranapanema] e outro ao rio Paraná, em áreas do Vale do Peixe.
Acontecida a República, as permissões foram ratificadas pelo novo governo através do Decreto nº 32, de 3 de dezembro de 1889.
A Sorocabana enfim vencera a rival Ituana, dando por encerradas suas competições rumo ao interior em 1892. Organizaram-se, então, numa só empresa formando a Companhia União Sorocabana e Ituana, com 820 quilômetros de linhas férreas e mais de duzentos quilômetros de vias fluviais, nos rios Tietê e Piracicaba.
O progresso que a Sorocabana trouxe a Botucatu se fez rápido, além das mercadorias e pessoas que chegavam, havia principalmente o escoamento em grande escala das mercadorias da região, como o café, algodão e outros produtos agrícolas e a madeira, além do transporte de cargas vivas, bovinos, suínos, muares e aves, sem dizer dos passageiros locais que com facilidade e conforto podiam se deslocar para outros centros.
Com a ferrovia também chegaram as primeiras indústrias de máquinas agrícolas, fábricas de móveis, imprensa, oficinas, residências para funcionários graduados e ferroviários da Companhia, com expansões de bairros e loteamentos para atender gentes que chegavam desejando ficar.
O projeto original da estrada de ferro, em seu prolongamento para o oeste paulista, a chamada linha Tibagi [Paranapanema] seguiria o curso pela direita do rio Pardo e não tinha previsto passagem por Rio Novo [Avaré], mas a ação do alferes Manoel Marcellino de Souza Franco, o Maneco Dionísio, a advogar pela mudança do traçado convenceu políticos e técnicos da Companhia Ferroviária para modificação do traçado e, assim, Rio Novo, que viria ser Avaré, teve a sua estação inaugurada em 1896, como conquista decisiva para o desenvolvimento local.
Maneco Dionísio, a maior expressão política/intelectual rio-novense [avareense] conhecida, amigo e parceiro intelectual de Prudente de Moraes, ambos cofundadores do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.
Apesar da modificação do projeto original, ainda se pensava o tronco sair de Avaré em direção a Santa Cruz do Rio Pardo, entendimento prevalente no ano de 1891, quando um grupo de fazendeiros liderados por Francisco de Assis Cintra requereu do Governo de São Paulo: "uma linha de bonds da freguezia de Fartura à linha Sorocabana, entre o Rio Novo (Avaré) e Santa Cruz do Rio Pardo" (DOSP, 21/06/1891). O Governo encaminhou à Companhia Sorocabana para as considerações e o projeto não vingou.
O engenheiro Henrique Augusto Kiogs iria mais além que as pretensões dos fazendeiros, ao solicitar privilégio de construção ao Governo de São Paulo "para uma estrada de ferro de Iguape até encontrar a estrada de ferro de ferro de Paranaguá a Curityba e um ramal, de Xiririca até encontrar o prolongamento da Sorocabana entre Botucatu e Santa Cruz do Rio Pardo" (DOSP, 24/07/1891), proposta desconsiderada.
Em 1893 a população santa-cruzense ainda acreditava na possibilidade de aproveitamento de parte do projeto original para os trilhos da Sorocabana, de Santa Cruz à foz do Rio Tibagi, conforme representação da Câmara, datada de 18 de julho de 1893 e encaminhada ao Senado do Estado (DOSP, 23/07/1893).
A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo apresentou o novo percurso do trecho férreo, a partir de Avaré, para Cerqueira Cesar, Óleo e Santa Cruz, para continuidade ao Tibagi, conforme mapa anexado ao Projeto de Lei nº 79, de 26 de julho de 1899.
A crise financeira da Sorocabana tecnicamente paralisando as obras projetadas e aquelas em execução, levou o governo federal encampá-la em 1904 e, no ano seguinte, transferi-la para o estado que a arrendou para o consórcio franco-americano liderado por Percival Farquhar, 1906, sob a denominação Sorocabana Railway Company, integrante da empresa Brazil Railway, controladora de diversas outras ferrovias no país. 
—A conquista de Maneco Dionísio encerrou o projeto original da linha Tibagi Paranapanema com passagem por Santa Cruz do Rio Pardo, pela margem direita do Rio Pardo. 
O novo percurso, retirratificado consoante mapa anexo ao Projeto de Lei nº 79, de 26 de julho de 1899, apresentava para Santa Cruz do Rio Pardo, apenas um ramal a partir de Bernardino de Campos, enquanto o leito principal chegaria até Salto Grande do Paranapanema, depois Salto Grande. Excluía-se também o Óleo.
Se o projeto trazia o encerramento de passagem do tronco da Tibagi/Paranapanema para Santa Cruz, o seu mapa anexo trazia a ideação de uma nova ferrovia, A Ferrovia do Peixe, a partir de Santa Cruz do Rio Pardo em direção a São Pedro dos Campos do Turvo (São Pedro do Turvo), São José dos Campos Novos do Paranapanema - Campos Novos Paulista, e pelo Vale do Peixe à fazenda Montalvão, região de Quatá e adiante.
No entanto um agravamento. A União Sorocabana-Ituana enfrentou crise financeira, pós fusão, obrigando o governo federal encampá-la em 1904 e, no ano seguinte, transferida para o governo estadual que a arrendou para o consórcio franco-americano liderado por Percival Farquhar, em 1906, sob a denominação Sorocabana Railway Company, como parte integrante da empresa Brazil Railway, controladora de diversas outras ferrovias no país.
Nesse interstício 1904/1906, o Decreto Federal nº 5349, de 18 de outubro de 1904, instruiu concessões anteriores para a Sorocabana, pelo Paranapanema, com novo trajeto agora de Avaré a Cerqueira Cesar, Manduri, Douradão (Bernardino de Campos), Ilha Grande (Ipaussu) e Ourinho [Ourinhos], para adiante, enquanto a Companhia Noroeste do Brasil exploraria a região do Aguapeí a partir da então Vila de Bauru em direção ao Rio Paraná, como prolongamento da União Sorocabana Ituana, para chegar àquele destino já em 1905.
O encontro ferroviário em Bauru foi exigência da Brazil Railway para assumir o arrendamento da Estrada de Ferro Sorocabana.
Em 1906 a estrada de ferro rumo a oeste chegou a Manduri e, em 1908, a Bernardino de Campos com ramal para Santa Cruz do Rio Pardo, aos 06 de abril de 1908.
Obediente ao Projeto Lei 79, de 1899, neste novo trajeto para a ferrovia fez-se efetivamente ausente a passagem do leito principal por Santa Cruz do Rio Pardo, todavia a ela foi dado o ramal, além do privilégio de cidade inicial para a futura estrada de ferro planejada que "passando por Campos Novos do Paranapanema, vá servir as terras da fazenda Montalvão [no município de Quatá] nas vertentes da margem esquerda do rio do Peixe, podendo prolongar-se até a barranca do rio Paraná" (Senado de São Paulo, Projeto nº 06 publicado em 19 de novembro de 1907).
Desta maneira a sequência da linha Tibagi alcançou Ipaussu e Ourinhos, ainda em 1908, e chegou a Salto Grande em 1910 onde permaneceu estacionada por dois anos, para enfim atingir Assis no ano de 1914, quando decidiu-se, por novo projeto, que a estrada não mais encerraria percurso defronte ao porto Tibagi.
De Ourinhos, em 1925, abriu-se a estrada férrea para o norte paranaense, a Estrada São Paulo-Paraná, chegando a Cianorte, dando origem a diversas localidades paranaenses, destacando-se Londrina e Maringá.
Sepultava-se outro sonho santa-cruzense, de ser a inicial de uma nova ferrovia - a do Peixe, quando se decidiu que a Sorocabana Railway Company seguiria adiante de Assis tomou rumo a Quatá, vertente esquerda do Rio do Peixe, originariamente pensado um ramal, no entanto, prolongado até Presidente Prudente, cuja gare instalada em 19 de janeiro de 1919, num simples vagão estacionado a servir de Posto Telegráfico, à volta do qual se ergueria a cidade. 
Em 1919 findava-se o arrendamento e a ferrovia retornou ao controle do estado, com a denominação de Estrada de Ferro Sorocabana; e, finalmente, em 1922 a linha atingiu as margens do rio Paraná, onde surgiu o povoado de Presidente Epitácio.
Conforme fundamentos colhidos junto aos acervos ferroviários a Estrada de Ferro Sorocabana, o avanço ferroviário não teve sérios problemas com indígenas, embora registros de mortes de trabalhadores, a maioria por doenças, outros de ataques por animais selvagens, uns poucos flechados por índios.
Desde os primeiros anos do século XX não havia índios que pudessem ameaçar de todo o avanço branco pelo sertão do Paranapanema, nem para os lados da bacia do Santo Anastácio. Índios bravios existiam somente para os lados dos Vales do Peixe e do Feio/Aguapeí, e apenas alguns desses grupos indígenas, em seus nomadismos cíclicos, meteram-se com os picadeiros.
Antes, a abertura da estrada térrea São Paulo-Mato Grosso, a conhecida 'Boiadeira', desestimulara qualquer presença selvagem na região. Alguns relatos de ataques indígenas aos trabalhadores ferroviários parecem mais imaginações estimuladas, a despeito das aparições e dos ataques tantas vezes contados, que até se transformaram em acontecimentos tidos reais.
Às entradas ou bandeiras pioneiras na região do Vale Paranapanema e depois as frentes de trabalho para a construção da Estrada Boiadeira, suas reformas e outros caminhos entre povoados diversos, fizeram reduzir e recuar indígenas, à exceção Caingangue que insistia permanecer às margens do Peixe.
Com a Sorocabana e explorações de travessias dos rios Santo Anastácio, Paranapanema, Tibagi e do próprio Paraná, fez-se mais eficiente para as integrações com o Mato Grosso, Paraná e mesmo o Paraguai.
A Estrada de Ferro Sorocabana foi importante contribuinte no andamento da ocupação em terras paulistas do oeste. A princípio, a ferrovia teria se originado para o escoamento de ferro da fábrica de São João do Ipanema, mas o plantio do café fez acontecer a sua interiorização.
Após o período da Primeira Guerra Mundial, a região do denominado fundão do Paranapanema abriu-se ao povoamento. O transporte mais rápido, seguro e barato, oferecido pela Sorocabana, trazia os compradores de terras das grandes fazendas subdivididas em áreas menores. Ao longo dos trilhos os núcleos urbanos se multiplicavam.
Os historiadores regionais referendam a importância ferroviária para integrações entre localidades diversas o ou aberturas de novas frentes de povoações, mencionando-se a gare de Sapezal no histórico entradismo dos letos, em 1924, que, depois da longa travessia oceânica, desembarcaram em Santos para seguir viagem de trem por quase 24 horas, e, depois, da estação sapezalense o percurso de 30 quilômetros ou mais, para a região entre as atuais Quatá e Tupã, além do rio do Peixe, onde fundaram as colônias cristãs Varpa e Palma.
A partir de Ourinhos, em 1925, abriu-se a estrada férrea para o norte paranaense, a Estrada São Paulo-Paraná, chegando a Cianorte, dando origem a diversas localidades paranaenses, destacando-se Londrina e Maringá. 
A criação de gado também viria a aparecer como uma condicionante para a expansão da ferrovia. Antes de alcançar as regiões interioranas, a Sorocabana experimentaria um plano de integração a um sistema de navegação fluvial pelos rios Tibagi e Paranapanema, mas não houve sucesso. De acordo com as expedições científicas de Teodoro Sampaio, estes rios não poderiam ser navegados e o projeto sofreu modificações.
Pode-se relacionar a expansão geográfica dos Caingangue com as pressões que as expedições de conquista foram promovendo. Alguns caciques optaram ou foram coagidos ao aldeamento e se fizeram aliados dos brancos, obrigando grupos recalcitrantes a se retirarem para lugares distantes da rota expansionista, liberando parte dos seus territórios para os fazendeiros e colonos nacionais e estrangeiros que não tardaram chegar até os novos locais escolhidos pelos índios.
Nas avaliações de alguns estudiosos foi erro do governo paulista arrendar a União Sorocabana-Ituana sem qualquer melhoria exigida, pós 1906, com diretores inacessíveis e moucos aos reclamos dos usuários mal servidos, a deterioração das vias e a não reposição material necessária para segurança das ferrovias. Em outras observações, eram sem razões os reclamos dos dirigentes da ferrovia, que produtos transportados permaneciam abandonados no pátio das estações, causando-lhes grandes prejuízos.
Para outros entendidos, a ferrovia pelo Vale Paranapanema e o direcionamento a Presidente Prudente e Presidente Epitácio, por Quatá, foi próspera e tornou progressistas os povoados ao longo de seu curso, no período de 1906 a 1919, além de importantes melhoramentos em sua malha, reformas e modernizações das estações, construções de casas para funcionários, aquisições de locomotivas, plantios de árvores (horto- florestais) e reflorestamento de áreas devastadas.
Analisando, em dias atuais, as localidades servidas pela malha ferroviária da Sorocabana, algumas realmente desenvolveram-se, por exemplos, Ourinhos, Assis e Presidente Prudente, mas a maioria não foi além de povoados estagnados por décadas, muitos deles extintos. Destarte, as gares muitas vezes foram apenas referências e não sinônimos de desenvolvimentos, a cumprir estudos localizados para as causas de progresso ou não de cada localidade.

1.1. Dos projetos modificados
Antigos relatores, e isto virou tradição, dão conta que o Coronel Antonio Evangelista de Souza, o Tonico Lista, teria impedido a Sorocabana passar seus trilhos por Santa Cruz do Rio Pardo. Outros coronéis noutras regiões teriam feito o mesmo, por exemplo, Coronel Sanches não quis a ferrovia passando por suas terras em Campos Novos Paulista e Platina.
Nenhuma objeção regional de qualquer coronel ou mandatário, a mudança de plano quanto ao trajeto da ferrovia teria sido imposição política dos Governos do Estado e da República para abrir e integrar novos povoados, com isso a preterir localidades mais antigas já em outros caminhos pioneiros de interiorização.
Para muitos, o crescimento de Santa Cruz do Rio Pardo no ultimo quartel do século XIX e a valorização de suas terras fora em decorrência do projeto ferroviário, para onde então acorreram os grandes fazendeiros interessados na criação de gado e produção do café. Santa Cruz teria todas as regiões do Turvo, Alambari, vertentes do Peixe e médio do Vale Paranapanema.
Quando a ferrovia chegou a Botucatu já os investidores montavam, em Santa Cruz do Rio Pardo, a infraestrutura vista desde as construções de casas para os novos chegadores, expansão urbana, quanto ao incremento comercial.
Não era sem razão. O Decreto Imperial n 10.090, de 24 de novembro de 1888 não deixava dúvidas quanto a passagem da ferrovia por Santa Cruz do Rio Pardo, assim como, acontecida a República as permissões foram ratificadas pelo governo golpista, conforme Decreto nº 32, de 03 de dezembro de 1889.
Sem nenhuma orientação em contrário, Santa Cruz continuava indicada para trecho principal ferroviário, e são dessa época as grandes serrarias e olarias estabelecidas no município, ao lado de outras indústrias e lojas, e  e até se pensava na instalação da energia elétrica para a zona urbana, objetivando progresso e melhores acolhidas aos investidores e operários.
Em 1892 ocorreu o prenúncio de modificações de trajeto da linha férrea, quando o governo determinou a fusão da Companhia com a Ytuana, na época à beira da falência. Projetos modificados, a ferrovia não mais seria pela margem direita do Pardo porque estava destinada a seguir de Botucatu para Avaré, aonde chegou em 1896.
Óbvios os veementes protestos dos fazendeiros da região do Pardo e políticos interessados, negociando-se compensação com projetada estrada de ferro a partir de Santa Cruz do Rio Pardo às vertentes do Peixe - (Mapa Anexo ao Projeto de Lei nº 79, de 26 de julho de 1899). 
A estrada férrea então prosseguiu curso de Avaré a Ouro Branco, depois Barra Grande, Cerqueira Cesar, São Bartolomeu e, enfim, no ano de 1906, chegava a Manduri e, logo depois a Bernardino de Campos, e não mais passaria por Santa Cruz do Rio Pardo, negociando-se apenas um ramal a expensas da Municipalidade, a partir de Bernardino de Campos, obra conclusa aos 06 de abril de 1908. A despesa do município seria compensada com a ferrovia, a ser construída conforme o Projeto Lei do Senado Paulista nº 06, de 29 de novembro de 1907, aprovado pelo parecer nº 78 do mesmo exercício.
Nunca esclarecido o suficiente por qual razão a linha férrea conhecida por Sorocabana, denominada Tibagi, originariamente projetada para passagem por Santa Cruz do Rio Pardo, não tenha assim acontecido, como também mal explicado porque o percurso Santa Cruz ao norte da barra do Peixe, no rio Paraná, jamais saiu das planilhas.
Cobra apresenta a versão, que "O primitivo traçado ia ter a Santa Cruz do Rio Pardo, São Pedro do Turvo, Campos Novos, Platina e, passando não mui longe de Monte Alegre, terminava na Água Boa." - (Nogueira Cobra, p. 188 notas).
Segundo Cobra, a modificação do traçado ocorrera:
—"Por serem excellentes as terras da margem do Paranapanema, onde muito cafezal, na epocha da construcção se encontrava em formação e mais pelo facto de os proprietarios dalli terem agido junto aos poderes públicos deu-se outro rumo ao traçado do antigo ramal do Tibagy que, de Mandury, se dirigiu para Salto Grande e Assis; de Assis ao Rio do Peixe, pelo espigão da margem esquerda e deste e do Santo Anastácio a barranca esquerda do Paraná, de onde se internará por Matto Grosso."
A melhor especulação informa que o projeto original Tibagi desviou-se da rota das localidades mais antigas, às exceções de Avaré [Rio Novo], Ipaussu [Ilha Grande] e Assis [Dourado], para originar novos povoamentos a cada parada [estação] do trecho, como objetivos do governo em melhor povoar e integrar o sertão, daí prejudicados locais tradicionais, como Santa Cruz do Rio Pardo, São Pedro do Turvo, Campos Novos Paulista, Platina e Conceição de Monte Alegre, ao lado de Espírito Santo do Turvo, São Domingos e Santa Bárbara, todos à beira dos caminhos pioneiros de interiorização terrestre, portanto já integrados.
Quanto à linha férrea de Santa Cruz ao rio Paraná, por terras do Vale do Peixe, era certa sua construção tanto que o fazendeiro Coronel José Rodrigues Tucunduva, habilidoso político, comprou terras no rio do Peixe, a fazenda Monte Alvão [Montalvão], onde atual município de Quatá, porque ali passariam os trilhos daquela estrada.
Os empenhos políticos de Tucunduva para a ferrovia em suas terras, especialmente em 1908 quando instalado o ramal Santa Cruz, constam dos Anais Históricos de Quatá - (Conde, referência, 'Quatá, um breve histórico da cidade e região', baseado no Álbum Histórico do Município de Quatá, de Bruno Giovannetti, edição de 1953).
Iguais referências são vistas em expedientes nos Arquivos do Governo de São Paulo, onde constam protocolos de intenções aprovados e assinados pela direção da Companhia Ferroviária e o Governo de São Paulo, com aprovação pelo Senado Estadual - Projeto de Lei nº 06 de 1907, todavia rejeitado pela Assembleia dos Deputados de São Paulo, oposicionista ao governo de Albuquerque Lins, apoiado por Tucunduva.
Isto divulgou embasamento que a dita Sorocabana não passou por Santa Cruz do Rio Pardo por decisão de Lista representando os fazendeiros do café. Em cada localidade dispensada pela ferrovia, a culpa recaia sobre os coronéis, evidentemente quando estes já falecidos.
Aníbal Jacques Sodré cogita que o ramal de Santa Cruz seria prolongado:
 —"(...) vista que em 1908, o Velho Chefe [Coronel Sanches de Figueiredo] já tinha ajustado com o Dr. Governador do Estado, (...), cujo traçado do prolongamento feito pela Secretaria da Viação e Obras Públicas do Estado de São Paulo, estaria assim organisado. Partindo de Santa Cruz do Rio Pardo, passando pelo espigão do ribeirão São João, em São Pedro do Turvo, seguindo pelo divisôr dos municipios de Campos Novos e S. Pedro do Turvo, até alcançar o Espigão da Fazenda Grande dos Toledos em Campos Novos, dahi entraria pelo espigão divisor do Ribeirão dos Veados em Catequese, por esse espigão adentro até alcançar a Fazenda Santa Lina e Quatá (...). Porém com mórte [assassinato] do Coronel Sanches de Figueiredo, e o grande abalo e confusão surgida nas óstes políticas de Campos Novos, exterminaram de vez para sempre, a estradas da Velha Comarca e do povo campos-novenses (...)"- (Sodré, 1951: 18 - citação 27).
—Referido trabalho, de 10 de janeiro de 1951, tem credibilidade de tradição histórica em face de reconhecimento pelo representante familiar Francisco Figueiredo que, inclusive, autorizou sua publicação.
Santa Cruz do Rio Pardo não conseguiu ser o pretendido entroncamento ferroviário e apenas o ramal lhe foi dado, conforme Lei Municipal nº 57, de 15 de agosto de 1906, na qual a Câmara autorizou o seu presidente, dr. Francisco de Paula Abreu Sodré, celebrar contrato para a construção de 24 quilômetros de ramal, a partir de Bernardino de Campos, obra financiada pelo município e doada ao Governo do Estado, com escritura lavrada em 29 de julho de 1912, no Cartório do 1º Ofício local.

1.2. De Bernardino de Campos a Santa Cruz do Rio Pardo - 'o ramal da dívida'
Todos os projetos ferroviários não vingaram e Santa Cruz foi excluída, definitivamente, de ser tronco ferroviário Tibagi/Sorocabano, embora nove gares construídas em seu território municipal: 'Baptista Botelho/Fazenda Mandaguahy, Bernardino de Campos, Luiz Pinto [atual] Fazenda Palmeiras, Ipaussu, Chavantes, Fortuna/Canitar, Ourinhos/Fazenda Ourinho, Salto Grande e a de Pau d'Alho/Ibirarema'.
Com a perspectiva de uma ferrovia iniciada em Santa Cruz do Rio Pardo, que ficou conhecida no projeto como Linha ou Ferrovia do Peixe, passando por São Pedro do Turvo, Campos Novos do Paranapanema, Quatá, e localidades em formação até à margem do Rio Paraná, a Câmara, com a ideação de seu presidente dr. Francisco de Paula de Abreu Sodré, propusera a construção de ramal da Linha Tibagi [Sorocabana], à custa do município, a partir de Bernardino de Campos.
Tratava-se de projeto ambicioso que faria de Santa Cruz importante entroncamento ferroviário, ligando a Ferrovia Tibagi à Linha Peixe, e mais o percurso de Santa Cruz para os lados de Espírito Santo do Turvo.
Para alguns esta era a visão empreendedora do político Francisco de Paula de Abreu Sodré, mas difícil compreender por que a ferrovia, em seu tronco principal, não vinha diretamente do Óleo ou do Distrito atual de Batista Botelho a Santa Cruz, sem passagem pela sua fazenda, onde uma gare.
O ramal foi aprovado pelos gestores da ferrovia e autoridades competentes, enquanto no município a sanção da Lei Municipal nº 57, de 15 de agosto de 1906, autorizando o Presidente da Câmara a celebrar contrato para a construção de 24 quilômetros de ramal, a partir de Bernardino de Campos, obra custeada pelo município e doada ao Governo do Estado, com escritura tardiamente lavrada em 29 de julho de 1912, no Cartório do 1º Ofício de Santa Cruz do Rio Pardo. Com essa doação toda a receita gerada pela ferrovia seria encaminhada à Sorocabana/ Governo do Estado.
O endividamento santa-cruzense no valor de 170:000$000 perdurou por décadas, avolumando-se ano após ano, e os lucros todos remetidos para o Governo do Estado conforme estabelecido em convênio assinado, esquecendo-se a compensação com a Ferrovia do Peixe, a ser construída no município, conforme o Projeto Lei do Senado Paulista nº 06, de 29 de novembro de 1907, aprovado pelo Parecer nº 78 do mesmo exercício.
Em 1910 já ninguém esperava a efetivação da Ferrovia do Peixe, e o município contraia novas dívidas para honrar compromissos com o Ramal Tibagi, no valor de Rs. 1:000$000, e não tinha recursos para implantar as melhorias básicas no centro urbano, como abastecimento de água e rede esgotos.
Nove anos depois (1919) o Governo do Estado anunciava encampação da Estrada de Ferro Sorocabana, e a Câmara mostrava a expectativa, pela apresentação de projeto de lei, pelo deputado estadual Ataliba Leonel, que autorizava o governo a conceder auxílio financeiro ao municipalidade, para o serviço de abastecimento de água e rede de esgotos, "compensando-se assim a doação feita ha annos pela Camara Municipal ao governo, do leito do ramal ferreo de Bernardino de Campos a esta cidade" (O Contemporaneo, 24/07/1919: 2).
Deu em nada e, já num outro tempo, 1927, o prefeito Pedro Camarinha reclamava das dívidas do município, desde 1908, em função do ramal ferroviário, e reivindicava soluções junto ao Governo do Estado de São Paulo, dr. Julio Prestes, de fortes ligações com Santa Cruz, num relatório datado de 03 de dezembro de 1927 (A Cidade, 25/12/1927: 1-2).
A ferrovia, com duas gares no ramal, era lucrativa, demonstrava o prefeito, num quadro sucinto, de 01 de janeiro a 30 de novembro de 1927, e acrescentava ao seu lamento, que o município perdera, ainda fontes de rendas com a autonomia dos seus distritos situados onde o leito principal da ferrovia.
O problema do 'ramal ferroviário' ainda se arrastaria por anos, até a celebração de um acordo entre o Município e o Governo do Estado de São Paulo, permitindo repasse de diferenças de fretes da estrada de ferro a favor de Santa Cruz do Rio Pardo.
Assim, em 10 de abril de 1957 - quase meio século após a instalação do ramal, a Sorocabana repassou ao Município a importância de Cr$. 389.986,10 - em 'cruzeiro velho', através do cheque nº 10.832, pago pela Matriz do então Banco do Estado de São Paulo, endossado pelo prefeito Lucio Casanova Neto (1956/1959), no entanto não contabilizado para a Prefeitura.
Lucio, dissidente do grupo político de Leônidas Camarinha, foi acusado de apropriar-se do dinheiro e, face denúncia feita, o Ministério Público que determinou investigações originando depois o Processo Crime 103.987, de 25 de abril de 1961. O acusado informou que o cheque 'endossado' fora dado ao Deputado Leônidas Camarinha para compra de uma caminhonete, a favor do município, jamais entregue, fato que se transformaria num maiores escândalos da política santa-cruzense, o 'Caso Martha Rocha' - referência ao modelo do veículo em homenagem à beleza da Miss Brasil 1954, num processo que se arrastou por longos anos na Justiça, com lances inauditos, que aqui não cumprem relacionamentos.
Confirmado, ainda, outros valores da mesma natureza, repassados em cheques pela Estrada de Ferro Sorocabana ao município, foram diretamente sacados e sem recolhimentos aos cofres da municipalidade, no tempo devido, caracterizando, em tese, apropriação indevida do dinheiro público por parte de Lucio.
Quando Santa Cruz podia, enfim, auferir rendimentos, afora os desvios ocorridos, o Decreto Estadual nº 39.228, de 17 publicado aos 18 de outubro de 1961, autorizou supressão do ramal ferroviário. O prefeito Onofre Rosa de Oliveira (1960/1963) dirigiu-se ao Governador Carvalho Pinto, solicitando a sustação do referido Decreto nº 39.228, expondo todo o histórico do malfadado ramal, construído à expensas da municipalidade e doado ao Estado sem nenhuma indenização.
Onofre juntou documentos das dívidas do município com empréstimos decorrentes para pagamento de compromissos com o ramal, e os comprovantes da Agência local da Sorocabana, sobre embarques e despachos, que desaconselhariam a desativação do ramal (O Regional, 19/11/1961: 2) cuja medida abalaria a situação financeira da municipalidade.
Não convenceu, e cinco anos depois, o Diário Oficial de São Paulo, edições de 25, 26 e 27 de outubro de 1966 declarou "fechadas ao tráfego as estações de Sodrélia e Santa Cruz do Rio Pardo, no Ramal de Santa Cruz do Rio Pardo. (...)", período do governo interino de Laudo Natel (06/06/1966 - 31/01/1967), vice na administração Adhemar de Barros (31/01/1963 - 31/01/1967).
Fechava-se o ramal ferroviário, mas sua história ainda continuaria com a edição da Lei Estadual de nº 4.494, de 21 de dezembro de 1984, assinada pelo Governador Franco Montoro, autorizando a Fazenda do Estado a alienar ao município, por doação, o imóvel nele situado - área total de 449.428 m² [quatrocentos e quarenta e nove mil e quatrocentos e vinte e oito metros quadrados], para fins de construção de casas populares e de estrada municipal, e de instalação de dependências municipais.
No novo governo municipal de Onofre Rosa de Oliveira (1982/1988), a Lei Municipal nº 1.011 de 2 de setembro de 1985 autorizou a aquisição do imóvel referido, por doação, para destinação de casas populares, abertura de estrada municipal e instalação de dependências municipais.
Em 2012, a gare foi restaurada para a instalação do Museu Pedagógico, um armazém reformado e em uso, a título precário por instituições e associações, e a antiga residência do Chefe de Estação - em estado de degradação e serve de abrigo a indigentes, enquanto o antigo leito ferroviário, sem nenhum trilho, jaz entre os divisantes. No antigo pátio uma concha acústica em construção, com palco de dez metros de diâmetro, rampa de acesso e escada, com estrutura metálica, cobertura em lona antichamas, e piso em concreto liso.
Questiona-se possibilidades que algumas construções ou posses estendidas, até particulares, estejam sobre terrenos da antiga Estrada de Ferro, agora de propriedade municipal.
A gare no Distrito de Sodrélia, propriedade municipal, em 2012 aparentava deterioração irreversível, salvo melhor juízo, sem a mínima segurança e condições sanitárias, praticamente inviável sua restauração ou reforma total, e, ainda assim, com moradores em seu interior.
O endividamento do município santa-cruzense no valor de 200:000$000, em causa do dito ramal, perdurou por mais de quatro décadas, avolumando-se ano após ano, e os lucros todos eram remetidos para o Governo do Estado conforme estabelecido em convênio assinado.
Excluída a coincidência de aquele ramal fazer parada na fazenda de Abreu Sodré, a atual Sodrélia, o contrato celebrado e o endividamento municipal sempre tiveram motivos para suspeição de desvio do dinheiro público. Não vem ao caso.

2. Ferrovia do Peixe - o grande engodo
Ferrovia do Peixe, com início em Santa Cruz do Rio Pardo 
Acervo: Ralph Mennucci Giesbrecht.
A visão político-capitalista santa-cruzense, da época, centrava-se na efetividade da Ferrovia do Peixe, e o ramo da Tibagi "parte inicial de um projeto que visava chegar com a linha até o rio Paraná, ao norte da foz do rio do Peixe, o que nunca aconteceu" (Giesbrecht, Estações Ferroviárias do Estado de São Paulo).
Não adveio, mas efetivamente era para nele se acreditar, afinal, o Projeto do Senado Paulista, sob nº 6, de 1907, já aprovado, trazia a ideação mapeada e descritiva do Projeto Lei 79 de 1899, para uma nova ferrovia que, "partindo de Santa Cruz do Rio Pardo e passando por Campos Novos do Paranapanema, vá servir as terras da fazenda Montalvão, nas vertentes da margem esquerda do Rio do Peixe, podendo prolongar-se até a barranca do Rio Paraná", e o engenheiro seria o Dr. Eduardo Loschi.
Em 1909 "As Comissões reunidas da Fazenda e Obras Publicas, convencidas das vantagens que traz a estrada de ferro auctorizada pelo Projetcto nº 6 do Senado do anno de 1907, é de parecer que seja o mesmo projecto approvado pela Camara".
A ferrovia desejada pelo Presidente da Província e já aprovada pelo Senado de São Paulo, não teve a necessária confirmação da Assembleia Legislativa Provincial, a sepultar de vez o projeto.
Muito se discutiu a exclusão de Santa Cruz como tronco ou inicial de uma ferrovia, e até se divulgou que a ferrovia não passou por Santa Cruz do Rio Pardo por decisão do Coronel Antonio Evangelista da Silva - o Tonico Lista, informação improcedente.
A melhor especulação informava que o projeto original Tibagi desviou-se da rota das localidades mais antigas, à exceções de Avaré [Rio Novo] e Cerqueira Cesar, para originar novos povoados a cada parada do trecho, para melhor povoar e integrar o sertão, daí prejudicados Santa Cruz do Rio Pardo, São Pedro do Turvo, Campos Novos Paulista, Platina e Conceição de Monte Alegre, ao lado de Espírito Santo do Turvo, São Domingos e Santa Bárbara, todos à beira dos caminhos 
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