domingo, 20 de dezembro de 2009

- Espírito Santo do Turvo

1. O princípio histórico
Documento eclesial de 1873, página 1,  sobre a
doação patrimonial ao Divino Espírito Santo
Acervo: Cúria Diocesana de Ourinhos -SP
Espírito Santo do Turvo tem história de formação independente de Santa Cruz do Rio Pardo, embora com início de desbravamento, também, a partir de 1850/1851, com a presença inaugural dos mineiros, em maioria, integrantes do bando de José Theodoro de Souza, em troca de terras se exitosa a campanha, além dos financiadores e aqueles, adquiridores de terras a seguir, para o início do processo civilizacional.
Esta é a história incontradita do pioneirismo sertanejo na região, e, não se sabe por quem e quando a informação que José Theodoro de Souza, em 1842, estivera na região e mesmo adiante, por lá deixara os primeiros desbravadores.
O professor Santos Silva (1954: 5), bastante conceituado e conhecido em Santa Cruz do Rio Pardo, sem citar fontes ou apresentar documentos, colocou Theodoro presente na região em 1842, quando teria fundado São Pedro do Turvo.
Oliveira Zanoni, por fonte o citado Santos Silva, apontou na mesma direção, "O primeiro no avanço por estes lados foi José Teodoro de Souza, que fundou São Pedro do Turvo em 1842" (Oliveira Zanoni, 1976: 55).
A possibilidade parece proceder dos antigos habitantes, tradição oral/familiar, exagerando a retroatividade usada pelos desbravadores para burlar a imperial Lei da Terra de nº 601/1850, para garantia de legitimações das posses, com algumas famílias se colocando como descendentes dos primeiros chegadores, muito antes da própria história e contraditando documentos, para a 'primazia destes direitos'
O autor memorialista José Joaquim Gonçalves Melo, descendente de pioneiros, diz textualmente, em sua obra 'Espírito Santo do Turvo - Sua história e seus filhos':
—"(...) foi no ano de 1842 que, para Espírito Santo do Turvo vieram o celebre posseiro mineiro José Teodoro de Souza, juntamente com Joaquim Antonio Pereira de Lima e Antonio Lemes da Silva. Estes foram quem fizeram o primeiro levantamento das terras do Rio Turvo e também do Rio Pardo (com documentos)" (Gonçalves Melo, 1999: 3).
—Assim como outros autores, não apresentou documento algum.
A desbravamento regional aponta, por documentos, que Jeronymo José de Pontes, casado com Justina Maria de Souza Ramos, irmã de José Theodoro de Souza, 'apropriara-se' identificando-se primitivo posseiro de terras às duas margens e vertentes do Rio Turvo, desde São Domingos até o Ribeirão de Santa Clara, aí insertada a região para a localidade, sendo o Pontes repassador de terras aos proprietários que viriam a seguir, no sistema denominado de posse articulada, para melhores adequações às exigências da Lei da Terra de nº 601/1850, ou seja, histórico de anterioridade de posse.

2. Os pioneiros
2.1. José Rodrigues da Silva: 

José Rodrigues da Silva, 'Bairro do Turvo', adquiriu terras de Jeronymo de Pontes, "a oito anos mais ou menos divisando de um lado o Rio Turvo e José Bernardino de Lima até a divisa com Francisco Dias Baptista e por outro lado com Joaquim Manoel de Andrade até fixar com o mesmo Turvo" (AESP, RPT/BRCT nº 397: 134-v). 

O registro paroquial, bastante sucinto, seria o resumo de pelo menos duas aquisições de terras, por recibos, o primeiro datado de 26 de março de 1851: 

"Uma sorte de terras na paragem denominada Turvo. Principiando no Rio do Turvo, nas divisas de Francisco Dias Baptista, seguindo pelo espigão acima, até frontear as cabeceiras das Águas, sempre divisando com o mesmo Baptista, cercando as Águas, até encontrar terras de Antonio Vicente de Lima, e daí desce, procurando o mesmo Rio Turvo, num Barreiro Grande, e daqui segue rio acima, até o lugar onde teve inicio esta divisa, divisando sempre pelo lado esquerdo com o mesmo Lima" (Pupo e Ciaccia, 2005: 129-130 E 20).
Aos 20 de fevereiro de 1854, Rodrigues da Silva teve por compra outra porção de terras do mesmo Pontes:
"Principiando no Barreiro de Lima, no Rio Turvo, por este acima até a barra do Ribeirão do Campo, quebrando-se pelo Espigão da direita, e ao subir o rio, divisando com José Bernardino da Luz, subindo pelo mesmo espigão, divisando com Francisco Dias Baptista, cercando as águas que vertem para o Ribeirão da direita, divisando sempre com o mesmo Baptista, até divisar com Joaquim Manoel de Andrade, até o Corguinho do Barreiro, onde tem princípio esta divisa" (Pupo e Ciaccia, 2005: 151-152 - Mapas E-51.1 e E-51.2).
Uma enormidade de terras, originariamente continuadas, que formaram a 'Fazenda Boa Vista':
—"(...) sorte de terras denominada fazenda da Boa Vista, situada no município de Espírito Santo do Turvo, desta comarca, e tendo uma parte na comarca de Agudos, fazenda essa que constituiu-se de todos os terrenos e vertentes do Ribeirão da Boa Vista, também por alguns chamado Ribeirão do Turvo, afluente da margem esquerda do Rio Turvo, e que confronta-se com os imóveis: Santa Barbara do Turvo, Capivary, Onça ou Boca do Campo e com o Rio Turvo" (DOSP, 05/02/1909: 396-397).
A sede da fazenda era denominada 'Santa Cruz da Boa Vista', ou 'Boa Vista', um bairro que futuramente viria ser 'Dona Amélia', atual 'Domélia' no município de Agudos. 

2.2. Joaquim Manoel de Andrade:
Aquistou terras Jeronimo José de Pontes no Turvo, aos 20 de fevereiro de 1854:
—"Uma fazenda de mattos de cultura no lugar denominado = Turvo = suas divizas são as seguintes= Principiando num barreiro por um corriginho [correguinho] acima devizando com José Rodrigues da Silva, a procurar um espigão do rebeirão devizando com o mesmo Rodrigues, rodeando pela direita devizando com Francisco Dias Baptista compreendendo toda a agua de minha moradadevizando com quem direito for, e seguindo pelo espigão abaixo até devizar com Antonio Vicente até o Rio Turvo onde findou esta deviza. (AESP, RPT/BTCT nº 124: 51v, datado de 30 de janeiro de 1856).

Anos depois, mais bem definida, a propriedade apresentavas as seguintes dimensões e confrontações:
—"Principiam do Barreiro, sobem pelo Turvo acima divisando com os successores de Antonio Vicente de Lima, até o Barreiro de cima, daqui quebram à direita por um correguinho acima a rumo, divisando sempre com os successores do finado José Rodrigues da Silva, até as ultimas vertentes de ambas as cabeceiras que cercam esta pequena agua, até divisar com os successores do finado Francisco Dias Baptista - quebram outra vez à direita, divisando sempre com os successores do mesmo finado, até encontrar terras de quem de direito for, e dahi continuam a divisar com os successores de Antonio Vicente de Lima, até dar no Barreiro onde tiveram principio e fim estas divisas" (DOSP, 07/04/1906: 9-10; DOSP, 01/09/1906: 5-6).
Referido Joaquim Manoel de Andrade foi casado com Anna Rodrigues de Jesus ou da Silva, e tem nome e história confundidos, pelas tradições, com o primo homônimo que fez história em Santa Cruz do Rio Pardo.
A correção somente foi possível com a revelação: "consta que Joaquim Manoel de Andrade deixou viúva sua mulher Anna Rodrigues da Silva ou de Jesus, ou seja, faleceu antes dela. Logo, seria impossível ele ter contraído novas núpcias" (Luciano Leite Barbosa, Mogi das Cruzes, São Paulo, pentaneto do casal pioneiro, conforme documentos oficiais apresentados a título de colaboração e correção de equívocos entre os homônimos Joaquim Manoel de Andrade; Luciano é autor de 'Pioneiros do Turvo', onde narra, documentalmente, a saga de seus antepassados).
O Joaquim Manoel de Andrade, citado entre os pioneiros no Turvo, era primo  de José Theodoro de Souza, posto sua progenitora, Mariana Rosa da Assunção, ser irmã de Maria Theodoro do Espírito Santo, a mãe de Theodoro. Ambas as mulheres eram irmãs da Bernardina Jesuina de Santa Catarina, a genitora do Andrade 'santa-cruzense', conforme assentos eclesiais. 

2.3. Manoel Antonio Pereira de Lima:

Não localizado registro paroquial de terras em seu nome, todavia consta, pelas tradições, pessoa ligada a José Theodoro de Souza, adquirente ou apossador de terras às duas margens do rio Turvo, divisando à direita com Antonio Lemes ou Leme da Silva, desde defronte a margem esquerda do ribeirão dos Macacos e, rio Turvo acima, até as divisas com Joaquim Manoel de Andrade; e, à margem esquerda do mesmo Turvo acima formando divisas com Joaquim Bernardes da Silva, até encontrar as terras de José Rodrigues da Silva, e, ainda, nas contravertentes, limites com Manoel Alves dos Reis.

As terras citadas inserem-se nas primitivas posses articuladas em nomes de Jeronymo José de Pontes e Manoel Alves dos Reis, com divisões em fazendas menores.

—A terras da Fazenda Macacos - no ribeirão de igual nome, adiante das divisas de Espírito Santo do Turvo, estão hoje em território de Paulistânia, a antiga Bandeirantes.

—Consta, não exclusa a homonímia, Manoel Antonio Pereira de Lima, batizado aos 27 de julho de 1845, em São João da Boa Vista, filho de João Pereira [de] Lima e Maria Jacinta (Records Preservation, Batismos, L 1833/1858: 106).

Correto, documentalmente, que em 1873 Manoel Antonio Pereira de Lima era proprietário de terras na região, e delas doou trinta alqueires ao patrimônio do Divino Espírito Santo para a formação de povoado, conforme escritura lavrada aos 09 de dezembro de 1873, em Livro 7 fls. 100 e 8 fls 001 do Tabelião de São Domingos, na residência de João Baptista de Almeida (Certidão de Transcrição pelo Cartório de Registro Civil e Anexos de Santa Bárbara do Rio Pardo, aos 14 de junho de 1960, cópia nos arquivos da Cúria Diocesana de Ourinhos).

Documentos eclesiais confirmam a doação (Edital de Patrimônio, de 04/08/1874 certificado pelo padre Francisco José Serôdio, aos 12 de março de 1875, Acervo da Cúria Diocesana de Ourinhos). Manoel Antonio Pereira de Lima, por cabeça do casal, ratificou sua doação patrimonial ao Juízo Municipal de Lençóis Paulista, aos 12 de novembro de 1874 (Acervo da Cúria Diocesana de Ourinhos).

Uma publicação no final do século XIX detalhava o que se sabia:

—"O terreno em que se acha edificada a villa de Espirito-Santo do Turvo, foi doado em patrimonio ao Divino Espirito-Santo, por Manoel Pereira de Lima e sua mulher, dona Francisca Aurea de Lima, por escriptura publica lavrada no cartorio de paz do districto de S. João de S. Domingos - S. João da Floresta, em data de 9 de dezembro de 1873, e está situado entre o arroio 'Agua Limpa' e o ribeirão 'S. Jeronimo', à margem esquerda do rio Turvo (...)." (O Estado de S. Paulo', 06/09/1900: 1). 

 

2.4. Antonio Lemes ou Leme da Silva

Ajustou propriedade adiante de Manoel Antonio Pereira de Lima onde prosperaram dois bairros rurais, do Leme de Baixo e do Leme de Cima, sem nenhum registro paroquial de terras. 

Num histórico da territorialidade para Espírito Santo do Turvo, a propriedade do Leme ou Lemes da Silva fazia divisas com Manoel Antonio Pereira de Lima, à margem direita do Rio Turvo, e tem o seu nome vinculado entre os pioneiros da localidade (Gonçalves Mello, 1999: 3), o que se confirma.

Os limites da propriedade dos Lemes da Silva permitem concluir que, originariamente, fazia parte da posse registrada por Manoel Alves dos Reis, no Turvo/Alambari.

 

3. Historicidade do lugar

A primeira referência documental civil para Espírito Santo do Turvo aparece na representação da Câmara Municipal de Botucatu ao Imperador, datada de 08 de outubro de 1858, no sentido de se extinguir a dependência judicial de Botucatu em relação a Itapetininga, da qual Termo Unido desde 29 de agosto de 1857, a justificar: "O município tem duas Freguezias a dos Lençoes e S. Domingos e ainda muitas vão se criando, como a de Bauru, Fortaleza, Turvo, Rio Novo, Piraju, Tiete, e Campos de Guanhandava" (Donato, 1985: 135 e 136). Turvo ou Rio Turvo são outras denominações para a atual Espírito Santo do Turvo.

Uma segunda menção surge em 1870, pela Câmara Municipal de Lençóis ao Presidente da Província de São Paulo, para reivindicar sua elevação a comarca separada de Botucatu, justificando abrangência sobre territórios determinados, "das Capelas do Espírito Santo do Turvo, São José dos Campos Novos e da do Espírito Santo da Fortaleza" (Donato, 1985: 131).

Quanto a formação administrativa "em 23 de março de 1878, após significativo crescimento a atual cidade recebeu o título de Freguesia (povoação, conjunto de paroquianos), graças a lei nº 08 sendo marcada historicamente como Patrimônio Religioso" (Espírito Santo do Turvo - Histórico da cidade). 

Aos 10 de março de 1885 Espírito Santo desmembrou-se do município de Lençóis Paulista, para tornar-se Vila e, consequentemente, município, pela Lei Provincial n° 20, e, anos depois, elevada sua sede à condição de cidade, pela Lei Estadual 1038, de 19 de dezembro de 1906, e assim aparecer nas Divisões Administrativas, de 1911 e de 1933.

O município foi extinguido pelo Decreto Estadual 6448, de 21, publicado aos 22 de maio de 1934 (DOSP) e seu território anexado do município de Santa Cruz do Rio Pardo, "mas com exclusão do Distrito Policial de Santa Cruz da Boa Vista [depois Domélia] que passará com as atuais divisas para o Distrito de Paz de Tupá e município de Agudos", assim a figurar como Distrito de Espírito Santo do Turvo, no município de Santa Cruz do Rio Pardo, nas divisões territoriais de 31 de dezembro de 1936 e 31 de dezembro de 1937.

Já avançado o século vinte, o distrito teve nome mudado para Rio Turvo, Decreto Estadual 9.775, de 30/11/1938, para figurar no quadro fixado para o período 1944/1948.

Aos 31 de dezembro de 1953, pela Lei Estadual 24.456, o distrito Rio Turvo voltou a denominar-se Espírito Santo do Turvo. Em divisão territorial de 01 de julho de 1960, permaneceu vinculado ao município de Santa Cruz do Rio Pardo, igualmente em divisão territorial de 18 de agosto de 1988.

Novamente elevou-se à categoria de município, sob a mesma denominação Espírito Santo do Turvo, por Lei Estadual 6645, de 09 de janeiro de 1990, desmembrado de Santa Cruz do Rio Pardo, tendo por sede o antigo distrito de Espírito Santo do Turvo, instalado em 01 de janeiro de 1993, assim vista em divisão territorial de 01 de junho de 1995, constituído do distrito sede em divisão territorial de 14 de maio de 2001.